DOSSIÊ CONTRA DEVASTAÇÃO DA SERRA DA GANDARELA
DOSSIÊ CONTRA DEVASTAÇÃO DA SERRA DA GANDARELA
Movimentos defensores da criação do Parque Nacional da Serra da Gandarela entregaram ao Instituto Chico Mendes (ICMBio), nesta semana, um dossiê com informações detalhadas sobre fauna, flora e as características da canga ferruginosa, bioma que só existe no quadrilátero ferrífero mineiro. A intenção dos ambientalistas é acelerar o processo de criação da reserva, em análise há dois anos.
O local também é alvo do maior projeto de mineração do quadrilátero ferrífero, a mina Apolo, novo empreendimento da Vale. O plano da mineradora é que, a partir de 2014, a mina produza cerca de 24 milhões de toneladas de minério de ferro por ano. Esse ritmo de mineração duraria pelos próximos 35 anos. Leia a seguir e veja aqui um aprofundamento a respeito do caso.
O projeto prevê também a construção de uma barragem de captação de água e acomodação de rejeitos. De acordo com a Vale, a expectativa é que mil postos de trabalho sejam gerados durante a operação.
A Serra da Gandarela está na divisa dos municípios de Rio Acima, Caeté (Região Metropolitana de Belo Horizonte), Santa Bárbara, Barão de Cocais e Catas Altas (Região Central). A cava gigantesca seria implantada exatamente no meio da área determinada para abrigar o parque da Gandarela. Para que a mineração seja autorizada, no entanto, o projeto de extração ainda terá que passar por uma série de audiências públicas com as populações das cidades afetadas, direta e indiretamente.
As principais preocupações dos ambientalistas são com a Bacia do Rio Paraopeba, já que grande parte das nascentes que alimentam os cursos d’água nascem na Serra da Gandarela, e com a canga ferruginosa, bioma típico do quadrilátero ferrífero, cuja maior área contínua remanescente se localiza exatamente na área delimitada do possível parque.
“A Serra da Gandarela é a caixa d’água que abastece o Rio Paraopeba e também onde espécies ameaçadas, como o lobo-guará, se abrigam e se reproduzem”, destacou Benedito Ferreira Rocha, um dos responsáveis por parte das manifestações em defesa da Serra.
O ambientalista destaca que a Serra da Gandarela é a única serra ainda sem minerações em toda a área compreendida pelo quadrilátero ferrífero. Afirma também que é lá onde a maior reserva de canga ferruginosa contínua do Estado – e consequentemente do mundo – ainda resiste. “Temos dezenas de espécies de plantas, insetos e anfíbios ainda não catalogados. Uma riqueza enorme para ser explorada. Por isso estão propondo a criação do parque”, afirmou.
Ainda segundo ele, o local tem função importante no turismo da Região Central do estado, especialmente na Serra do Caraça, vizinha da Gandarela. “É na Gandarela que o lobo-guará circula, se alimenta e se reproduz antes de ir visitar o (seminário do) Caraça de noite”, pontua.
O cuidado com a flora, fauna e com as águas na Região Metropolitana de Belo Horizonte foi um dos assuntos levantados ao longo da semana, durante o 2º seminário de elaboração do Plano de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana de Belo Horizonte (PDDI), que está sendo elaborado por um grupo de 140 especialistas e representantes das prefeituras dos 34 municípios da RMBH. O plano será apresentado em novembro.
De acordo com um dos coordenadores do projeto, o urbanista Rodrigo Simões, as mineradoras ainda não se interessaram em participar das discussões. “A impressão que temos é que as mineradoras só se importam com o lucro, cumprem aquilo que a legislação prevê, e só. Parece que eles olham por cima dos interesses comuns”, afirmou.
Segundo ele, a mina Apolo e o mineroduto que deve levar o minério de Conceição do Mato Dentro até o Rio de Janeiro constituem graves ameaças às águas da Grande Belo Horizonte nos próximos anos. “Temos que pensar hoje em maneiras de garantirmos a água dos nossos filhos no futuro”, disse.
Faltam três audiências decisivas
A permissão para o início do processo de Licença Prévia da mina Apolo vai depender de pelo menos mais três audiências públicas, que devem acontecer nos próximos seis meses em cidades de influência indireta da mina, ou seja, municípios que têm cursos de água ligados às nascentes da Gandarela. Locais e datas ainda estão indefinidos.
Na última audiência pública – a sexta desde o início do processo de licenciamento –, as discussões sobre o projeto vararam a madrugada. A audiência foi realizada no prédio do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea-MG), em Belo Horizonte. O auditório ficou lotado.
Desde o anúncio da possibilidade de implementação da mina, ambientalistas dos municípios afetados vem participando sistematicamente de todos os eventos. Em abril, participaram de um abraço simbólico à Serra da Moeda. Nesta semana, nas discussões do Plano de Desenvolvimento da Região Metropolitana de BH, eles foram aplaudidos.“Estamos mobilizados para evitar essa tragédia ambiental”, disse Benedito Ferreira Rocha, coordenador do Movimento Pró-Meio Ambiente de raposos.
Ainda segundo ele, apesar das prospecções minerárias já terem sido feitas e de a Vale ter anunciado o empreendimento, ainda há esperança de que o projeto seja barrado pelos órgãos ambientais. “Todo mundo pode sondar. Daí ao governo aprovar uma mina que vai comprometer a água de parte importante da Região Metropolitana é outra história. Estamos confiantes que vamos conseguir impedir isso”, disse.
De acordo com o secretário de Estado do Meio Ambiente, José Carlos Carvalho, cabe ao Governo estabelecer as condicionantes ambientais para cada empreendimento. A partir daí, afirma, a empresa avalia sua viabilidade e decide ir adiante, ou não.
Área custou R$ 145 milhões
O anúncio da compra da mina Apolo pela Vale foi feito em novembro de 2009. A mina foi comprada por US$ 145 milhões. O vendedor, a Mineração Apolo, recebeu pelas reservas um preço fixado no fim de 2004, num acordo entre as duas empresas. À época, especialistas avaliaram a negociação como “extremamente vantajosa” para a Vale.
A empresa pagou US$ 0,10 por tonelada de reserva medida. O preço era infinitamente menor do que o pago, por exemplo, em janeiro deste ano pela Usiminas na compra da mineradora J.Mendes – que saiu por US$ 1,19 por tonelada. Com a compra da mina Apolo, a reserva de minério de ferro da Vale cresceu em quase 1 bilhão de toneladas – passando de 4 para 5 bilhões de toneladas – só na região do quadrilátero ferrífero.
No anúncio do negócio, realizado no Palácio da Liberdade com a participação do então governador Aécio Neves, o diretor-executivo de ferrosos da Vale, José Carlos Martins, chegou a afirmar que a empresa continuava atenta a novas possibilidades de compra no Brasil.
Ele disse também que o total de investimentos previsto para esse projeto seria de cerca de US$ 2,1 bilhões. A mina Apolo possui minério em qualidade semelhante ao da mina de Brucutu, uma das principais áreas de extração da Vale, localizada na vizinha São Gonçalo do Rio Abaixo.
Originalmente, a Mineração Apolo não era uma mineração de ferro, mas de pedras ornamentais, inclusive de turmalina. A descoberta de grandes jazidas de minério e a existência de infra-estrutura logística para transportar o produto facilitaram o negócio.
Fonte: Hoje em Dia
FONTE: http://www.justicanostrilhos.org/nota/480